Suécia tem jornada de trabalho de 6 horas

10/01/2017 22h08 - Atualizado em 11/01/2017 15h32

"A Suécia vai introduzir oficialmente a jornada de trabalho de seis horas." Disse uma notícia da BBC em Estocolmo, Keith Moore.

A matéria já foi vista 40 milhões de vezes no Facebook e conta ainda que os trabalhadores do país vão continuar recebendo o mesmo vencimento menal, uma vez que os especialistas descobriram que as pessoas produzem em seis horas o mesmo que produziriam em oito.

A notícia foi divulgada em diversos países e, como Moore mora na Suécia, ficou animado. Mas também se surpreendeu com o fato de que não tinha sido avisado da diminuição de seu regime trabalhista.

"Vou morar na Suécia!!", brinca Sandra Andersson no Facebook. "Mas, espera... eu já moro na Suécia. Não há jornada de trabalho de seis horas no meu emprego, mas de nove e dez horas na maior parte do tempo. Mas me dão café grátis para que eu não durma depois de trabalhar seis horas", acrescenta.

"Ou é uma piada ou meu chefe é um comediante, pois sou sueco e definitivamente não estou trabalhando nem vou trabalhar apenas seis horas por dia", afirmou Eric Bergman.

Ou seja: a realidade é outra compara a que foi noticiada.

O correspondente da BBC conversou com Kerstin Ahlberg, do Departamento de Direito do Trabalho da Universidade de Estocolmo, para o programa "More or Less", da BBC.

"Há experiências, mas não há uma tendência geral para a jornada de trabalho de seis horas", explicou a especialista.

"O que a lei diz na Suécia é que o tempo de trabalho não deve ultrapassar 40 horas semanais, a não ser que sejam necessárias horas extras e, neste caso, o limite é de 48 horas semanais", acrescentou.

Uma das experiências comentadas por Ahlberg tem sido aplicada em um lar para idosos na cidade de Gotemburgo, onde os patrões estão observando se há uma melhora no cuidado com os moradores e nas condições de trabalho para os funcionários.

Os administradores reduziram as horas de 80 enfermeiras assistentes - desde fevereiro elas trabalham seis horas por dia tendo direito ao mesmo salário.

O grupo de controle, para comparação, é formado por enfermeiras de outro lar para idosos que fazem os turnos normais.

Os resultados preliminares da experiência demonstram que parece existir uma diferença a favor das enfermeiras que trabalham menos horas.

As que trabalharam menos horas tem mais tempo com os idosos, levando-os para caminhadas, jogando com eles, lendo para eles com mais frequência do que as enfermeiras do outro asilo.

Outro observado é que as enfermeiras que trabalham seis horas dizem que se sentem mais saudáveis, mais atentas e calmas.

Esses dados são bons, mas não há muita precisão neles. Para uma comparação mais clara, há a média de número de faltas por problemas de saúde: 15 dias entre as trabalham menos, e 31 dias entre as que tinham jornadas de oito horas diárias.

A julgar por essa experiência, a diminuição da jornada de trabalho foi boa tanto para as enfermeiras como para os idosos.

O resultado é simples, ambos trabalhador e idoso estão mais felizes e mais bem cuidados durante seis horas. Mas o que acontece depois- As enfermeiras não podem simplesmente ir embora e deixar os idosos sozinhos.

A resposta é encontrar mais enfermeiras. E isso resulta em mais gastos para o dono, no caso de um negócio particular, ou para o governo, caso seja um serviço público.

O aumento nos gastos foi um dos motivos pelo qual o experimento quase foi encerrado. Outra iniciativa parecida em Kiruna, no norte do país, foi cancelada depois de 17 anos.

Mas apesar das desistências, há companhias que aderiram a jornada de seis horas, como foi o caso de algumas no setor de tecnologia e até um centro de serviço da Toyota em Gotemburgo, onde isso teve início há 13 anos.

Ao observar que os clientes estavam insatisfeitos com as longas esperas e que os mecânicos estavam estressados e cometendo erros, o diretor-geral na época, Martin Banck, mudou o turno de 7h às 16h para duas jornadas - das 6h às 12h e das 12h às 18h -, com o mesmo salário e menos tempo de descanso.

É importante ressaltar um detalhe crucial: e os lugares que precisam de pessoas trabalhando 24 horas por dia-

Todos ficaram felizes, os lucros aumentaram em 25% e a alteração aconteceu de forma permanente.

E a ideia da jornada mais curta não é algo relativamente novo.

"Aconteceram várias experiências no século 19 com um número diferente de horas de jornada de trabalho, e depois os efeitos foram examinados", contou John Pencavel, professor emérito de Economia da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos.

"Houve um exemplo famoso na década de 1890, quando o dono de uma fundição de ferro em Manchester e o sindicato local fizeram um acordo para reduzir as horas de trabalho de 54 horas por semana para 48 horas. O efeito na produção foi pouco e, depois de tentar durante um ano, os dois lados concordaram que a mudança deveria ser permanente."

Esse sucesso convenceu o governo daquela época a reduzir as horas de outra fábrica, desta vez em Londres. E na Alemanha fizeram o mesmo em uma das grandes indústrias óticas do país.

Mas muitos patrões continuaram com a jornada mais longa, por medo de uma queda na produção.

O resultado foi que, no fim do século 19, muitos trabalhadores ainda estavam cumprindo a jornada de 54 horas semanais.

A grande mudança ocorreu junto à Primeira Guerra Mundial, com pesquisas feitas em fábricas de munições.

"A maioria dos trabalhadores era mulher e algumas tinham que encher as bombas com explosivos. O explosivo afetava o fígado das trabalhadoras, que ficavam com as mãos e o cabelo amarelados. Em alguns casos, esse trabalho levava à morte", explicou Pencavel.

"Desde o começo da guerra, a semana de trabalho tinha sido estendida a 70, 80 e 90 horas por semana. E havia alguns que se perguntavam se isso era realmente conveniente."

O governo britânico estava tão preocupado que formou uma comissão de médicos e acadêmicos para investigar. Parte do estudo se concentrou nas horas de trabalho e no nível de produção e, diferente do estudo do século 19, essas pesquisas eram feitas com o rigor científico necessário.

O pesquisador principal era Horace Vernon, acadêmico da Universidade de Oxford que havia trabalhado em uma fábrica de munições.

Trabalho das mulheres nas fábricas de munições era tão longo, quanto perigoso

"Ele descobriu que a produção não era maior durante as semanas mais longas. Por isso concluiu que reduzir as horas tinha pouco ou até nenhum efeito negativo na produção", lembrou o economista.

Depois da Segunda Guerra Mundial, a tendência era a redução nas horas de trabalho. Assim, as pesquisas sobre a relação entre o tamanho das jornadas e a produção caíram no esquecimento.

Mais recentemente, os estudos deixaram de lado a quantidade produzida e se concentraram mais na relação entre horas de trabalho e saúde.

"Trabalhar por muitas horas já foi associado com declínio cognitivo e doenças cardiovasculares", lembra Pencavel.

No entanto, esses estudos se concentraram em pessoas que trabalham cerca de 50 horas por semana.

Com isso, há outra questão a ser indagada: reduzir a semana de trabalho para 30 horas não seria demais?

"Me surpreenderia encontrar alguma organização que não se beneficie com a jornada de trabalho de seis horas, mas imagino que para algumas não seria apropriado. Cada uma deve tentar o que é melhor para ela", opinou o economista.
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